Discorreremos no presente trabalho acerca do instituto do Empréstimo Compulsório. Inicialmente analisaremos o conceito desse. Segundo o Dicionário de Direito Constitucional:
Trata-se de tributo pela qual o Estado impõe ao contribuinte o empréstimo de certa quantia em dinheiro ao Poder Público e cuja devolução é obrigatória em data estipulada pelo próprio poder. (BASTOS, p. 53, 1994)
Em seguida o próprio autor levanta a dúvida a respeito da natureza jurídica do Empréstimo Compulsório. Interessante destacar o conceito encontrado no Dicionário Brasileiro de Direito Constitucional, que se abstém no uso da palavra tributo:
Instrumento fiscal que se caracteriza pela exigência coativa de prestação pecuniária, por parte do Estado, condicionada à restituição do valor recolhido, em um momento posterior. (DIMOULIS, p. 141, 2007)
Ele difere do Empréstimo Público por independer da vontade do indivíduo de contratar com o Estado: “os empréstimos compulsórios não se confundem com os empréstimos públicos, tendo estes natureza contratual e aqueles natureza tributária”. (OLIVEIRA, 2010). [1]
APANHADO HISTÓRICO
Em breve resgate histórico percebemos que o empréstimo compulsório tem duas origens obscuras, mas podemos identificá-lo na Primeira Guerra Mundial, nos países europeus, e no Brasil difundiu-se a partir da Segunda Guerra Mundial. Entretanto a falta de parâmetros legais favoreceu diversos abusos, e conforme aponta Hugo de Brito Machado, a função do instituto estava distorcida, sendo usado para “suprir as deficiências de seu [Governo Federal] caixa sem os controles atinentes ao poder de tributar” (MACHADO, 2007), além dos diversos casos de inadimplemento.
Das discussões a respeito dos limites e da natureza jurídica do referido instrumento fiscal surgiram diversas correntes doutrinárias que culminaram na edição da súmula 418 do STF, em 1964: “O Empréstimo Compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional da prévia autorização orçamentária”.
Entretanto tal entendimento foi alterado em 1965 com a edição da Emenda Constitucional n. 18, que introduziu o seguinte texto: “Somente a União, em casos excepcionais definidos em lei complementar, poderá instituir empréstimo compulsório”. Os casos excepcionais foram definidos pelo Código Tributário Nacional, de 1966, em seu art. 15.
A Constituição Federal de 1967 manteve a mesma orientação, e a EC n. 1 de 1969 trouxe em sua redação nova polêmica, entendendo alguns doutrinadores que existiriam duas espécies de empréstimo compulsório, um de natureza tributária e um de natureza diversa. O STF, no julgamento do RE 111.954-3/PR, entendeu que não haviam duas figuras distintas.
NATUREZA JURÍDICA DO EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO
Na constituição em vigor podemos encontrar alusão ao empréstimo compulsório no art. 148 com a seguinte redação:
Art. 148 – A União, mediante lei complementar, poderá instituir Empréstimo Compulsório:
I – para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;
II – no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no Art. 150, III, (b).
Ainda existe o mesmo dilema a respeito da natureza jurídica do instituto. Grande parte da doutrina entende ser um tributo, e estar sujeito aos princípios tributárias, dentre eles, Sacha Calmon, Regis F. de Oliveira, Geraldo Ataliba, Paulo de Barros Carvalho. Alguns doutrinadores entretanto entendem não ser caso de tributo, como Hugo de Brito Machado, por não constituírem acréscimo ao patrimônio do Estado, já que é uma receita que deve ser devolvida:
Tendo-se em vista o conceito universal de tributo como receita, no sentido não apenas financeiro, mas econômico, o empréstimo compulsório não é tributo, pois não transfere riqueza do setor privado para o Estado. (MACHADO, 2010, p.73)
Dentre os argumentos por considerar o Empréstimo Compulsório tributos destacamos primeiramente que, a constituição federal, depois de alteração da E.C. n. 42, se refere, em seu artigo 150, §1, ao artigo148 como tributo [2].
Ademais Luiz Felipe Silveira Difini (2008, p.61) destaca que o conceito vigente em nosso ordenamento de tributo, especificamente no art. 3 do CTN, não inclui na definição a obrigatoriedade de não ser restituível. Lembramos também que a lei 4.320/64 considera receita pública inclusive os empréstimos, mesmo considerando que o valor não será definitivamente integrado aos cofres públicos.
Pacificado o entendimento de serem os empréstimos compulsórios tributos, aplicam-se a eles todas as regras constitucionais pertinentes à instituição e cobrança de tributos.
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Discorreremos sobre os detalhes desse instituto.
É sustentado pelo art. 148 da CF, sendo detalhado no art. 15 do CTN. Importante lembrar que o inciso III do art. 15 do CTN foi revogado pela constituição de 1988, por não estar previsto no art. 148 desta.
Destacamos ser um tributo de competência exclusiva da união, não podendo estados e municípios instituí-lo. Deve ser instituído por lei complementar, e após a E. C. n. 32 ficou expressamente proibido instituí-lo por meio de Medida Provisória. Importante mencionar também que a Constituição não indica o fato gerador do tributo, apenas as situações em que poderá instituí-lo. O fato gerador será definido posteriormente por Lei Complementar.
A aplicação da receita arrecadada está vinculada a despesa que fundamentou sua instituição. Luiz Felipe S. Difini traz interessantes observações sobre o tema, destacando que eventuais descumprimentos a essa regra acarretam em desvio de finalidade, que é causa de responsabilização dos administradores, porém não invalida o empréstimo já instituído, a não ser que o desvio se dê quando da edição da própria lei que instituiu o Empréstimo Compulsório (DIFINI, 2008, p.67)
Das duas situações de sua implementação, quais sejam o inciso I “para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;” e inciso II “no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no Art. 150, III, (b).” do art. 148 da CF, temos que ao primeiro não se aplica o princípio da anterioridade, só sendo este aplicável ao segundo. Parta da doutrina entende pela incoerência de tal limitação, conforme sustenta Luiz Felipe S. Difini, pelo caráter urgente do investimento público: “Melhor reconhecer a evidente impropriedade e contradição da norma: o que é urgente não pode esperar o próximo exercício” (DIFINI, 2008, p. 66).
Entretanto autores como Hugo de Brito Machado e Paulo de Barros Carvalho possuem entendimento diverso:
Parece incoerente que, em se tratando de investimento público de caráter urgente, tenha de ser observado o princípio da anterioridade. Não há, todavia, tal incoerência. O investimento público de relevante interesse nacional pode exigir recursos a que somente em vários anos seria possível atender com os tributos existentes. Por isso, é possível a instituição de um empréstimo compulsório que funcionará como simples antecipação de arrecadação. (MACHADO, 2010, p. 72)
Pode parecer um contra-sentido aludir-se à urgência ou à relevância do interesse nacional e, concomitantemente, amarrar-se ao expediente a um termo inicial de eficácia. Todavia, a experiência brasileira, pródiga em abusos nesse delicado campo da esquematização jurídico-social, bem recomenda a cautela imposta. (CARVALHO, 2005, p. 32)
Segundo o art. 15 do CTN a lei que instituir o empréstimo compulsório deverá fixar o prazo e as condições para o seu resgate.
São esses os requisitos para a instituição do Empréstimo Compulsório no ordenamento vigente.
REFERÊNCIA
BASTOS, Celso Ribeiro. Dicionário de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 1994.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de Direito Tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
DIMOULIS, Dimitri (Org.). Dicionário Brasileiro de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
____________. Natureza jurídica do Empréstimo Compulsório. Revista Dialética de Direito Tributário. 147. ed. p. 68-80. São Paulo: Dialética, 2007.
OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 3. ed. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2010.
[1]“A vontade do indivíduo de contratar com o Estado é fundamental para que se evitem discussões sobre o denominado empréstimo compulsório, que é tributo.”
[2]“A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I (…)”